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O JARRO
Este jarro despreza o olhar
Refratado em sua base circular
Mal traçada de um côncavo granulado.
Um jarro em que poucos derramaram a curva límpida
Da água, cujo esmalte gasto como um véu roto
No contorno do bocal – o gargalo levemente disforme –
Denuncia o triunfo do barro.
Poucas nuanças de tabaco e terracota costeiam
O longo do jarro e se coalham no seu bojo.
A saturação da cor dá a medida do seu peso,
Como a imperfeição da forma lhe confere leveza.
Um menino o deixa cair por falta de modos.
A senhora refresca o rosto com a água dele vertida
Enquanto a alça se rompe no ponto de equilíbrio.
Um monge fere ainda mais sua borda
Fazendo trovejar seu cajado.
Ao observador não resta mais do que a especulação
Que junta seus cacos, antes de um esgar premonitório
Que reconstitui o jarro aberto, couro lustroso esticado
Como uma tapeçaria em que quase se pode ler –
Lascas finas de barro e chão, algumas mais espessas,
E arredondadas e pontiagudas – uma inscrição esgarçada
Que se ramifica em fiapos.
Este jarro despreza o olhar
E, mais que fazer jorrar a água,
Ele parece ter sido esculpido com água jorrada
De modo que neste jarro qualquer derramamento
Se faz segundo a economia estrita do desperdício.
J. C. P.
julho de 2009
30 de julho de 2009
20 de julho de 2009
Inédito de Tal a Fuga
JOGADOR, ESTETA
Só mais uma no maço
nesta mesa de sargaços
detentora de descartes
arbitrários, nada fáceis
Este ouropel é mais do que eu poderia supor
Fosse um bumerangue sob custódia, um ioiô
seria eternamente descartado e recobrado
carta sensível ao meu dom
Baixa a tiragem desse naipe
O parceiro exige o bate de um leque
legendário, tarefa do renitente
ás de ouros, um pingente.
J. C. P.
1 de julho de 2009
Os analectos de Jean-Lúcio [2]
O Mestre perguntava sempre sem muito ânimo, com a falta de ênfase que lhe era tão impossível quanto própria: de que são feitos os desertores?
Pin amava a língua dos nobres, mas a exercitava sem domínio ou paixão. Mêncio denunciava o contrassenso em alta voz: “alguém que pensa ser traído pelo dialeto da sua terra natal jamais forjará um estilo”.
“Um homem de princípios nada pode nos dizer sobre a dignidade”, bradava com frequência Kon. No que o Mestre se limitava a retorquir: “o velho Kon não se engana quando busca a dignidade e nada é menos digno do que isso”.
Sabendo que naquela tarde encontraria o amado discípulo, Jean-Lúcio estirou o pano cinza e espesso no qual fazia tombar as varetas escuras do Grande Livro e – antes de soltá-las em desordem no tecido impecavelmente alinhado – dirigiu-se a seu círculo em versos lacônicos:
A túnica com que cingiram
Meus ombros é a lição pura
Da compaixão súbita –
Cálida veste cujo perfume
Conduz-me ao Caminho!
O jovem Lao, escrivão real que praticava a arte da caligrafia e da gramática como poucos, procurou o Mestre para saber o que seria de sua posição quando a Casa de Tzi deixasse de ser a única escola a oferecer homens doutos ao imperador. Disse Jean-Lúcio: “a arte da escrita nada tem a ver com os sábios métodos de Tzi ou com o Grande Imperador e sobreviverá a ambos”.
*
Pin amava a língua dos nobres, mas a exercitava sem domínio ou paixão. Mêncio denunciava o contrassenso em alta voz: “alguém que pensa ser traído pelo dialeto da sua terra natal jamais forjará um estilo”.
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“Um homem de princípios nada pode nos dizer sobre a dignidade”, bradava com frequência Kon. No que o Mestre se limitava a retorquir: “o velho Kon não se engana quando busca a dignidade e nada é menos digno do que isso”.
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Sabendo que naquela tarde encontraria o amado discípulo, Jean-Lúcio estirou o pano cinza e espesso no qual fazia tombar as varetas escuras do Grande Livro e – antes de soltá-las em desordem no tecido impecavelmente alinhado – dirigiu-se a seu círculo em versos lacônicos:
A túnica com que cingiram
Meus ombros é a lição pura
Da compaixão súbita –
Cálida veste cujo perfume
Conduz-me ao Caminho!
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O jovem Lao, escrivão real que praticava a arte da caligrafia e da gramática como poucos, procurou o Mestre para saber o que seria de sua posição quando a Casa de Tzi deixasse de ser a única escola a oferecer homens doutos ao imperador. Disse Jean-Lúcio: “a arte da escrita nada tem a ver com os sábios métodos de Tzi ou com o Grande Imperador e sobreviverá a ambos”.
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